Dr. Slump & Arale-chan Slump The Book, Hoyoyo Edition – (14 de Setembro de 2007)
Mensagem de Akira Toriyama + Entrevista com a Equipe
Mensagem de Akira Toriyama
Por causa disso, assistir ao Dr. Slump Arale-chan, que ia ao ar todas as quartas-feiras às 19h, era realmente um momento muito exaustivo para mim.
Como também era uma checagem, me disseram para assistir direito, então não tinha como simplesmente ignorar.
Para piorar, era justamente na hora do jantar, com meus pais e minha esposa todos reunidos…
Era literalmente um treinamento espiritual. Nem conseguia sentir o gosto da comida.
Ficava espiando de canto de olho.Graças a esse “treinamento espiritual”, consegui assistir a boa parte da série de TV.
Com isso, passei a entender muito melhor o esforço de toda a equipe de produção do anime.
A gente costuma assistir anime de forma leve, sem pensar muito, mas só para concluir um único episódio já é um trabalho absurdo, de deixar qualquer um tonto.
Muito obrigado a todos por seus esforços.Claro, para vocês isso não é nenhum tipo de treinamento, então eu ficaria realmente feliz se puderem curtir de coração toda a bobagem, a fofura e o ritmo tranquilo da vida no interior.
Akira Toriyama
Mensagem Com Desenho
Muito obrigado mesmo por adquirir o DVD-BOX de “Dr. SLUMP”!
Sei que é meio estranho eu, como autor original, dizer isso, mas sou péssimo em olhar para os meus próprios trabalhos. Mesmo quando viram livro, quase nunca tenho coragem de abrir.
Nem sei direito se é vergonha ou o quê, mas o fato é que não dá. Até em jogos onde eu fiz o design dos personagens, fico todo incomodado.
Entrevista com a Equipe
Ouvimos as histórias de várias pessoas que estiveram envolvidas na adaptação para anime de Dr. Slump Arale-chan.
Entrevista com a Equipe
Planejador
Profile
Seus principais trabalhos incluem Dokkoi Daisaku, Uchū Tetsujin Kyōdain, Daitetsujin 17, Uchū kara no Messēji: Ginga Taisen, Dragon Ball e Shin Bikkuriman, entre outros. Atualmente, vive em Manila, onde se dedica à escrita de romances. Sua obra mais recente é Shiawase no Miss Terry, publicada pela Bungeisha em setembro de 2007 – uma história sobre Miss Terry, a heroína que vem visitar corações tristes
Keizo Shichijo
“Um verdadeiro ‘grande sucesso’ conquistado em terreno desconhecido.”
Do Live Action ao mundo da animação.
Na verdade, durante a universidade, eu fazia parte do ESS¹, e fui diretor de uma peça em inglês numa competição tradicional entre quatro universidades — Meiji, Waseda, Rikkyo e Hitotsubashi — disputando a Taça da Embaixada Britânica. Ganhamos o primeiro lugar.
Eu pensava: “Se eu puder viver fazendo o que gosto, já está ótimo”, e foi justamente essa vitória que me levou a entrar na Toei.
No começo, valorizaram meu inglês, e acabei trabalhando até como intérprete do time profissional de beisebol da Toei, o Toei Flyers. Depois disso, a proposta para Dokkoi Daisaku² foi aprovada, e acabei assumindo a produção de séries live-action para TV, como Daitetsujin 17. Foi então que, de repente, um dia, recebi a ordem de ser transferido para a Toei Animation. Diziam que, dali em diante, o anime entraria numa era de internacionalização…
Na época, eu quase não conhecia ninguém da área de animação, e realmente me sentia isolado — como se estivesse completamente deslocado.
Para enfrentar o que, para mim, parecia uma transferência completamente injusta, não me restava alternativa a não ser apostar tudo em um projeto que refletisse minha própria vontade. Eu estava decidido: se não conseguisse audiência, pediria demissão.
Por isso, mesmo tendo que mexer nas minhas economias, me dediquei intensamente à coleta de informações.
No meio disso tudo, uma funcionária do escritório me recomendou Dr. Slump. Mas, na época, eu só tinha lido dois ou três capítulos avulsos, sem o começo, então minha impressão sincera foi: “Que obra mais estranha…”. Logo depois, me recomendaram Slump de novo — dessa vez num bar frequentado por jovens, chamado Clube dos Jovens Detetives! Aí, só para ter certeza, pedi pro pessoal da empresa procurar o primeiro capítulo pra mim. Quando li… pensei na hora: “Isso dá certo!”. E o primeiro motivo foi o traço excepcional do Toriyama-sensei.
Havia um realismo ficcional elaborado, que fazia você imaginar toda a história só de olhar. Em segundo lugar, o cenário da Vila Pinguim era simplesmente genial. Talvez tenha sido justamente esse ambiente que permitiu que os acontecimentos malucos imaginados por Toriyama-sensei se desenrolassem com tanta liberdade. Em terceiro, o excelente design dos personagens — como o Senbei ou a Arale de óculos. E, por fim, o fato de que todos esses elementos são habilmente adaptados a partir de informações do nosso cotidiano e meticulosamente entrelaçados na narrativa do dia a dia.
Dá até pra dizer que havia uma sensação de estar sendo gentilmente guiado… Isso é o puro talento do Toriyama-sensei, né?
A propósito, a funcionária do escritório que me apresentou Slump queria ser produtora. Como eu já tinha mostrado a ela alguns exemplos de propostas minhas, foi com ela que finalizei o plano para Slump — e assim começou o projeto de adaptação para anime.
Uma produção realizada com a melhor equipe.
No começo do projeto, por coincidência, acabei sentado ao lado do Nobuhiro Komatsu em um bar em Shinjuku e, conversando sobre cinema, acabamos nos dando muito bem. Sempre acreditei que a qualidade de um filme ou animação depende principalmente do elenco, então queria muito que o Komatsu-san trabalhasse em Dr. Slump Arale-chan. No entanto, na época, era bastante difícil contratar um diretor de áudio externo. Felizmente, conseguimos que ele aceitasse o trabalho. Dedicamos bastante tempo ao processo de audições e, no fim, conseguimos montar um elenco com o qual ficamos realmente satisfeitos.
Conheci o Studio Junio por meio do produtor Takeshi Tamiya*¹. Na época, eu ainda era inexperiente em anime e, quando tinha conflitos com a equipe, ele frequentemente atuava como mediador (risos).
O diretor de animação Minoru Maeda também estava começando a mostrar seu talento como jovem artista da Junio, e o diretor de arte Mataji Urata assumiu o projeto pessoalmente e com entusiasmo, como chefe do departamento de arte. Entre todos, o gerente de produção Matsuji Kishimoto… Na época, eu o chamava carinhosamente de “Kishimoto-chan”, mas sem os esforços dele, o sucesso da produção certamente teria estado em risco.
Eu costumava exigir rigidamente a imagem da obra que tinha em mente e, por isso, discutia bastante com ele. No entanto, com o tempo, ao entender melhor as condições de produção dentro da estrutura de uma “empresa”, percebi o quanto ele lutava e se esforçava para manter tudo funcionando.
A razão pela qual não colocamos um responsável pela composição da série no roteiro foi por uma convicção pessoal: eu achava que não havia ninguém mais familiarizado com Arale-chan do que eu mesmo… (risos).
Em especial, na segunda metade da história — incluída na “Edição Hoyoyo” — o progresso do anime acabou alcançando o do mangá original, então tivemos que criar muitos episódios originais. A chave para essas histórias originais era ter ideias que não destruíssem o universo criado no original, mas que usassem os personagens como ponto de partida para levá-los a situações extraordinárias.
Foi nessa fase que Koyama Takao e Terui Keiji*² também passaram a contribuir com os roteiros. Mesmo assim, criar algo original que estivesse à altura do mangá era extremamente difícil… Passei a entender bem os esforços de Toriyama-sensei!
Entre os que se destacaram estão Inoue Toshiki e Shimada Mitsuru, que estrearam como roteiristas nesta obra. Ambos se esforçaram muito, mesmo sendo novatos. Shimada-san, em particular, aceitou o desafio de escrever vários episódios originais. Na época, falei bastante coisa para eles… mas, sinceramente, sou muito grato a todos os roteiristas envolvidos.
Simples, elegante e acolhedor.
Quando Dr. Slump começou a ser publicado em revista, seus fãs eram, em sua maioria, universitários, e acredito que a obra era vista como algo pop e estiloso. No entanto, por uma questão de honra pessoal, eu queria desenvolver o anime como uma obra que pudesse ser amada por um público amplo, por muitos anos. Eu acreditava que obras que mostram mundos extraordinários com impacto visual e velocidade até podem gerar uma moda passageira, mas logo acabam sendo esquecidas pelo público. Por isso, pensei em incluir o nome Arale-chan no título, chamando de Dr. Slump Arale-chan.
O maior charme desta obra é, sem dúvida, a própria Arale-chan. Foi com essa convicção que decidi, na produção, apostar nela. Ela é alegre, despreocupada, inocente e imprevisível! Sua pureza infantil e seu poder absurdo são de uma energia contagiante e incomparável.
Para transformar o programa em algo que pudesse ser assistido por toda a família — inclusive crianças pequenas — achei que seria essencial ter um nome fácil de entender: Arale-chan. No entanto, essa mudança de título encontrou forte oposição inicial por parte da Shueisha. Mesmo assim, após muita explicação e insistência, parece que eles compreenderam a minha visão. Depois disso, me confiaram completamente o projeto e ofereceram uma cooperação generosa. Na produção, meu maior foco foi: como expressar a alegria e o humor que surgem nos “seres humanos simples e sinceros” que Toriyama-sensei retrata, enquanto sonham com o extraordinário?
Fiz com que a robô Arale-chan encarnasse a perspectiva das crianças, permitindo que elas, por meio de suas traquinagens, explodissem suas frustrações do cotidiano e se divertissem com o que há de mais fantástico no fora-do-comum. Mas acima de tudo, o mais importante era manter tudo sempre: simples, elegante e acolhedor.
Quando a equipe e o elenco entram no clima, é comum sentirem vontade de fazer trocadilhos sem parar ou adicionar elementos que podem acabar comprometendo a elegância da obra, mas quanto a isso, fui categórico e inflexível. Exagerar é perigoso.
Na época, passei três horas tentando convencer um diretor que insistia em incluir uma cena que não existia no original. No fim, com o diretor Okazaki-san como testemunha, fui direto: “Se esse corte ainda estiver lá na hora da dublagem, ele será removido — e eu exigirei indenização!” Fui firme nessa ordem. (suspiro)
Mais tarde, fui informado de que ele havia deixado o projeto… Fiquei realmente triste. Ele se foi sem ter compreendido…
A história por trás da criação do tema de abertura “Waiwai World”.
O tema de abertura é o “rosto do programa”, por isso queríamos algo realmente à altura — o melhor possível! Com esse espírito, abrimos uma convocação ampla para letras, mas, mesmo assim, nenhuma parecia ser realmente decisiva. E então chegou o dia da reunião final com Toriyama-sensei, em Nagoya. Eu estava no trem-bala a caminho da cidade, tomado por um sentimento de total desespero. No entanto, ao chegar ao saguão do hotel onde havíamos combinado de nos encontrar, Toriyama-sensei não aparecia. Quando liguei para ele, ele respondeu: “O manuscrito não vai ficar pronto a tempo… Será que poderíamos adiar nossa reunião por duas horas?”
Naquele instante, reacendeu em mim um apego ardente àquela letra que ainda não tínhamos. Pensei: “Ainda dá tempo!”
E foi assim que, imediatamente, liguei para Kashi Asa-san e pedi a sua colaboração por telefone. Chamar ela de minha “arma secreta” pode soar meio rude… mas, veja bem: ela é atriz, pintora abstrata — com prêmios recebidos até na França —, cantora de chanson³ e, enfim… uma pessoa realmente cheia de sensibilidade e bom gosto. Duas horas depois, conforme o combinado, Toriyama-sensei chegou. Quando o convidamos a escolher entre as muitas letras disponíveis, ele pegou uma delas e disse: “Acho que esta aqui é boa… E você, Shichijo-san?”
A letra que ele me estendeu era justamente Waiwai World, a que eu e Kashi Asa-san havíamos conseguido finalizar às pressas, no último instante. Confesso que isso — até hoje — eu guardei em segredo, com medo de mal-entendidos…
Mas depois disso, quando chegamos à etapa de colocar música na letra, tivemos mais problemas (risos). As músicas que apareceram nas audições eram todas em estilo rock rápido, bem ao gosto da época. Achei que funcionariam muito bem em um filme, mas não combinavam de forma alguma com a minha visão de fazer um programa de longa duração.
Eu fui o único que insistiu contra a opinião de todos. Por causa disso, as reclamações sobre minha teimosia chegaram até o chefe do departamento de planejamento da sede da Toei, e até meu superior na equipe de animação começou a se preocupar comigo.
Bem, o esboço de piano do Shunsuke Kikuchi, que eu estava defendendo, era claramente mais simples em comparação com outras músicas que usavam diversos instrumentos. Mas, para mim, havia ali a doçura da Arale-chan e a simplicidade da Vila Pinguim. Se fosse uma comida, seria aquele sabor leve do qual você nunca enjoa.
No fim das contas, todos acabaram cedendo diante da minha teimosia. Na verdade… mesmo insistindo tanto, eu também estava inseguro por dentro. Quem compensou essa minha incerteza foi o arranjador Takashima Akihiko, indicado por Maeyama-san da Columbia, responsável pela parte musical. Ele deu um toque incrível de impacto à introdução e, no momento da gravação da orquestra, pensei: “Agora sim! Vai dar certo!”
A certeza e a alegria diante da alta audiência.
Por culpa também deste produtor teimoso aqui (risos), a verdade é que levou bastante tempo desde a produção do episódio piloto até o início da transmissão oficial. Mas, desde a fase de preparação, já sentíamos claramente que o programa teria uma audiência alta. Quando começamos a exibir, por volta de abril, a audiência era de cerca de 14%, se bem me lembro. Mas as crianças, sabe como é — durante as férias de verão, é quando elas decidem “quais programas vão continuar assistindo”.
Por isso, eu tinha plena certeza de que Arale-chan ultrapassaria 20% em setembro. Esperei com confiança pelo fim das férias de verão e, quando tudo aconteceu exatamente como previsto, pensei: “Conseguimos!”
Mas houve um momento mais adiante… Quando, por apenas um instante, a audiência ultrapassou 40%. Para ser sincero, aquilo me pegou totalmente de surpresa!
O futuro da história
A animação evoluiu bastante desde aquela época: as técnicas de edição melhoraram, o ritmo ficou muito mais acelerado e a expressividade ganhou força. Como a informação agora é transmitida com mais rapidez, o público está sempre buscando algo novo. Isso exige conteúdos cada vez mais densos e ideias criativas que não possam ser facilmente imitadas.
Quando uma obra acerta, a tendência é que ela rapidamente se torne um negócio de escala global. Mas, no fim das contas, o verdadeiro segredo para um sucesso está em como ela consegue fazer o espectador alçar voo do tédio da rotina para a expansão do mundo extraordinário.
Se até agora o que se buscava era o “super-herói” que resolve tudo com força… talvez, daqui pra frente, o que as pessoas realmente estejam buscando seja um super-herói da alma – alguém capaz de curar o coração das pessoas. Não acha?
Finalmente, para Toriyama-sensei…
Graças a você, pude desfrutar de tantos encontros e acontecimentos — e gravar, assim, um momento precioso na minha vida. Mas a sua vida… ainda parece estar em pleno andamento, como se ainda estivesse sendo serializada.
“O que será que vai acontecer agora?” *³ Mal posso esperar para descobrir.
*1 “Depois de atuar como assistente de direção em filmes live-action como “Os 13 Assassinos” no estúdio da Toei em Kyoto,
trabalhou na Toei Animation como diretor de “Babel II”, além de participar do planejamento de séries como “Capitão Harlock, o Pirata do Espaço” e “Kinnikuman”.
*² Takao Koyama (atualmente conhecido como Takao Kosei) é o fundador do grupo de roteiristas Brother Noppo.
Roteirista veterano, mais tarde foi responsável pela composição da série Dragon Ball Z.
Keiji Terui era funcionário da produtora responsável por Don Dracula, conhecido como o anime de cancelamento mais rápido da história.
Esse incidente acabou aproximando os dois e tanto Koyama-san quanto Terui-san se envolveram posteriormente como roteiristas em Dr. Slump Arale-chan.
*³ Um verso familiar do tema de abertura de Dr. Slump Arale-chan, “Waiwai World”.
A frase seguinte à mencionada é: “Vamos lá! Isshisshishi! Divirta-se!“
Entrevista com a Equipe
Produtor
Profile
Ex-produtor da Fuji Television. Após atuar como diretor do Departamento de Desenvolvimento de Licenciamento, atualmente é presidente e CEO da Fujiland Co., Ltd. Entre seus projetos mais representativos estão: Dragon Ball, Haisukuru! Kimengumi, Patariro! e 1000-Nen Jo’ou, entre outros.
Tokizo Tsuchiya
“O anime que mudou o rumo da Fuji TV.”
O anime que se concretizou após muita insistência, como em “Sanko no Rei”⁴.
Naquela época, a Fuji TV estava enfrentando dificuldades com a audiência. Foi então que o Hieda-san*¹, que era o chefe do Departamento de Vendas de Rede na época, foi transferido para o departamento de programação. Ele passou de chefe de departamento diretamente para diretor do departamento de programação, pulando o cargo de vice-diretor. Um salto de dois níveis! Eu, que era apenas um funcionário comum na Vendas de Rede, fui transferido junto, em um movimento lateral, direto para a Programação.
Então, vi a proposta de planejamento de Dr. Slump e li o mangá original. Era realmente interessante. Disse: “Vamos seguir com isso!”
Falei com o pessoal da Toei Animation: “Vamos fazer isso aqui na Fuji, sem demora.” Mas… demorou um pouco até conseguirmos o sinal verde da Shueisha.
Naquela época, a Shueisha era bastante cautelosa quanto à adaptação de suas séries em andamento para anime. Chegou um ponto em que pensei: “Enquanto for só eu tentando, não vai dar certo mesmo…”
Então pedi ao então diretor de programação, Hieda-san, que interviesse diretamente. Quando um diretor de programação vai pessoalmente, a Shueisha também não pode mandar apenas um gerente, acaba sendo necessário enviar um executivo. E foi exatamente isso que aconteceu: um alto executivo veio, mas mesmo assim, ouvimos: “Olha, infelizmente isso não será possível…”
Fomos duas vezes, e em ambas recebemos uma recusa. Depois disso, tentamos todo tipo de articulação nos bastidores — e acabamos patinando por quase três meses. Mas eu simplesmente não conseguia desistir. Eu queria fazer esse projeto acontecer de qualquer jeito.
Então eu disse ao Diretor Hieda: “Diretor, me desculpe, mas por favor, vá lá mais uma vez. Consegui marcar uma reunião para hoje. Se não der certo desta vez, eu vou desistir desse projeto.” E assim, ele foi pela terceira vez.
Aconteceu que, a essa altura, o executivo da Shueisha já tinha virado praticamente amigo do Hieda-san. Afinal, toda vez que ele ia lá, conversavam por quase uma hora. Então, dessa vez ele disse: “Entendi. O diretor de programação da Fuji veio até aqui três vezes. Deu para perceber a paixão de vocês pelo projeto. Vamos considerar.”
No dia seguinte, recebemos a resposta positiva. Foi assim que o projeto finalmente se concretizou. Se eu tivesse desistido depois da segunda tentativa, provavelmente nunca teria sido aprovado enquanto o mangá ainda estava em publicação. Depois disso, avisei o pessoal da Toei Animation: “Conseguimos!”
A partir daí, o que restava à Fuji TV era decidir em qual faixa de horário encaixar o anime. Foi esse o caminho até a adaptação.
E acho que insisti tanto porque, além de ler a proposta de produção, eu também tinha lido o mangá original e já estava completamente cativado pela obra. A essa altura, eu realmente acreditava: “Se fizermos isso, vai ser um sucesso com certeza.”
O programa de sucesso que mudou a emissora de TV.
Quando virou anime, foi um sucesso estrondoso. Tanto a tiragem da Jump quanto a audiência do anime dispararam.
No fim das contas, é o poder da obra. O mundo fascinante criado por Toriyama é divertido de ler na Jump e também é divertido de assistir na TV. No caso dessa obra, o público se expandiu além das crianças: conquistou até funcionárias de escritório e donas de casa. Mas veja bem, era exibido às quartas-feiras, às 19h. Eu até achava que a audiência poderia chegar a uns 20%, mas jamais imaginei que chegaria a 30%. Mesmo naquela época, atingir 30% nesse horário era algo impensável.
Hoje, então, é totalmente impossível. Já na segunda ou terceira semana após a estreia, o programa ultrapassou os 20% e a audiência só subia a cada semana. Não existia nenhum outro programa assim. Isso acabou se tornando um marco, e a partir daí, a popularidade da Fuji TV explodiu. Acho que foi por volta de dois anos depois que conquistamos a tríplice coroa da audiência*². Sem dúvida, foi uma obra que mudou o rumo da Fuji TV em todos os sentidos.
A Vila Pinguim é um mundo reconfortante
Eu trabalhei com o anime por cinco anos e meio, e nunca me cansei dele. Era uma obra que nunca perdia o brilho, sempre trazendo algo novo, empolgante, que fazia o coração bater mais forte. Dá vontade de espiar o que se passa na cabeça do Toriyama-sensei, né?
Desde que o anime começou a ir ao ar, minha maior preocupação — e acho que muitos outros também sentiam isso — era proteger aquele mundo. Eu só pensava: “Vamos cuidar bem desse universo”, “Vamos preservar a atmosfera da Vila Pinguim”. Afinal, não se pode destruir o mundo que Toriyama-sensei criou com tanto carinho.
Vendo hoje, nessa sociedade moderna tão caótica e exaustiva, eu realmente acho que Dr. Slump representa um verdadeiro refúgio, um mundo de tranquilidade.
Se você ainda não conhece, espero de coração que assista a este DVD e se sinta acolhido. E quanto ao Toriyama-sensei… gostaria muito que ele desenhasse uma nova obra. Já está na hora, não acha? E quando isso acontecer… por favor, deixa a Fuji TV exibir! (risos)
*1 Assumiu o cargo de Diretor de Programação da Fuji TV em 1980.
Atualmente, é Presidente do Conselho de Administração da Fuji Television Co., Ltd.
*² Tríplice Coroa refere-se a uma emissora de TV que alcança a maior audiência em três faixas de horário:
das 19:00 às 22:00, o horário nobre às 19h às 23h e o dia todo, das 18h às 23h.
A Fuji TV conquistou a Tríplice Coroa de audiência por 12 anos consecutivos, de 1982 a 1993.
Entrevista com a Equipe
Diretor-chefe
Profile
Diretor de animação e diretor geral. Estreou Estreou como diretor de animação na série de TV “Tetsuwan Atom”. Atualmente é presidente da Synergy SP. Obras representativas incluem: “Shin Ace o Nerae!” (diretor-chefe), “Dragon Ball” (diretor da série) e muitas outras.
Minoru Okazaki
“Tudo aquilo que todos curtiram está ali, condensado.”
Uma direção criativa que permite brincar livremente no mundo de Toriyama.
Recebi a proposta de trabalho para “Slump” e, quando comecei a ler o mangá original que me deram, achei muito divertido. Para começar, os desenhos eram como nada que eu já tivesse visto. Cada ilustração tinha um charme próprio — havia personalidade e era cativante. O design era fresco, inovador. E a história era leve, descontraída, nunca ficava pesada.
Pensei: “Uau, que material incrível nós temos!” Havia alguns diretores veteranos, mas, no geral, a equipe era composta por muitos jovens. A política que eu decidi foi a seguinte: se há cinco diretores, haverá cinco estilos diferentes de direção. Então, contanto que os cortes e as expressões da direção não saíssem do universo do Toriyama-san, eu deixava que cada um trabalhasse com liberdade. Quase nunca disse algo como ‘faça assim’. O que eu realmente fazia questão era que não se fugisse do mundo de Toriyama. Por exemplo, houve uma vez em que discutimos uma piada de um corte de direção que havia chegado da equipe e debatemos isso com o Shichijo-san por uma semana!
Nas cenas de ação, tomei cuidado para não deformar os personagens de maneira estranha. Muitas vezes, quando exageramos a deformação⁵, o desenho acaba ficando esquisito. No caso dos personagens do Toriyama-san, achei que esse tipo de direção visual não agradaria ao público. Por isso, por exemplo, não usamos aquele tipo de imagem em que o personagem fica completamente amassado. Mesmo quando levava um soco, ele não se deformava — simplesmente era arremessado para longe, mantendo sua forma.
Diversão nos Bastidores.
Em termos de audiência, rapidamente alcançamos os 20%. Nós tentávamos não nos preocupar muito com números, mas claro que é ótimo quando a audiência vai bem. Quando atingimos nosso recorde de audiência, a Fuji TV até organizou uma festa para comemorar. Mas, pessoalmente, o momento que mais me tocou foi numa tarde, quando eu estava saindo para jantar e vi uma criança dizendo: “Ah! O Dr. Slump vai começar!” e saindo correndo para casa. Foi ali que pensei: “Nossa, que bom estar trabalhando com animação”.
Foi um momento de verdadeira felicidade. A equipe também se dava muito bem. No verão, por exemplo, íamos todos juntos para casas de praia nos divertir. E no inverno, eu e o diretor de animação Maeda adorávamos esquiar, então íamos para Naeba umas três vezes por mês. Nessas ocasiões, quem também curtia esqui dizia: “Vou também!” e acabava se juntando à viagem.
É cheio de diversão atemporal.
Meu personagem favorito é o Gatchan. Claro que gosto da Arale também, mas quando o Gatchan aparece, sinto como se estivesse mimando meu bichinho de estimação, ou como se fosse meu cachorro favorito, e isso foi ótimo. Além disso, embora seja um vilão, o Mashirito também é difícil de deixar de lado. Aquela personalidade dele é hilária. Esse jeito de estar sempre se dando mal é, de certo modo, bem divertido.
Meu item favorito, e isso é um pensamento meio de adulto, são os “óculos que veem através de objetos inanimados”*¹ (risos). Aqueles que deixam você ver através das roupas. É do episódio em que a professora Yamabuki chega de Scooter.
Quando eu era criança, havia gente que ia ao parque vendendo óculos dizendo que davam para ver através de qualquer coisa. Todo mundo comprava por curiosidade perversa, mas é claro que era tudo mentira. Lembrei disso e ri muito no episódio em que o Senbei faz os tais óculos de transparência. Aquilo ficou marcado para mim. Esse lado pervertido é o charme do Senbei. Embora ele sempre acabe se dando mal (risos).
*1 Óculos que veem através de objetos inanimados.
Após ser dito pela Arale que seu corpo “não tem nada de importante”, ele os criou para observar o corpo feminino.
Os óculos permitem ver através de roupas e veículos, revelando apenas os corpos.
Entrevista com a Equipe
Diretor de Animação Chefe
Profile
Animador e atual diretor da Synergy SP. Entre seus trabalhos representativos como designer de personagens e diretor de animação estão: Dragon Ball, Captain Tsubasa, Touch, Hiatari Ryoko! e Soreike! Anpanman, entre muitos outros.
Minoru Maeda
“Desenhar as ilustrações do Toriyama-san em si foi uma diversão.”
Um conceito do mundo americano que você nunca viu antes.
O meu encontro com “Dr. Slump” foi, claro, lendo a “Jump”. Durante uma reunião para um filme, o assunto surgiu e comentamos: “Isto é perfeito para animação”, e nos perguntávamos: “Quem será que vai produzir isso?”
A primeira impressão que tive ao ver foi que parecia uma história em quadrinhos americana. Naquela época, ninguém havia desenhado um estilo assim antes. Não que o desenho fosse uma cópia dos quadrinhos americanos, mas a visão de mundo e a atmosfera tinham uma semelhança.
Técnicas de animação que não se afastam do mundo de Toriyama.
Depois que aceitei o trabalho, minha intenção com o design dos personagens foi, antes de tudo, captar fielmente o estilo original do Sr. Toriyama. Foi o mesmo caso com Dragon Ball. Por exemplo, se no mangá original uma corda era desenhada com 10 linhas, no anime nós também desenhávamos com 10 linhas.
Antigamente, o design de personagens para anime costumava envolver criar novas ilustrações adaptadas especificamente para a animação. Mas eu era contra isso. Não importa se o original é tecnicamente bem ou mal desenhado — o importante é que existem fãs que gostam daquele estilo e assistem ao anime por causa disso. Se você muda o estilo, perde-se a essência.
Por isso, procurei não mudar nada sempre que possível. Essa minha filosofia continua até hoje. Claro que ajudou o fato de o desenho do Sr. Toriyama ser muito bom, mas mesmo que tivesse erros de proporção ou de traço, eu ainda teria mantido o estilo original exatamente como era.
Quem deu mais trabalho, sem dúvida, foi a Arale-chan. Como precisávamos animar o que Sr. Toriyama desenhava no mangá, o maior desafio foi lidar com os óculos quando ela virava de lado. Era muito difícil decidir: pintar as lentes com a cor da pele? Usar uma cor própria para os óculos? Em anime, normalmente se pinta os óculos com um tom azulado, certo? Mas quando o personagem está de frente, os óculos somem… Esse tipo de coisa era complicada.
Outra coisa de que eu sempre cuidava como diretor de animação ao revisar os key frames era garantir que a arte não saísse do universo visual do Sr. Toriyama. Sempre prestei muita atenção a isso. O ideal, para mim, era um layout onde o quadro do mangá fosse transportado diretamente para a tela. Reproduzir as mesmas expressões e gestos do mangá fazia com que o público pensasse: “Ah, eu já vi isso no mangá!”, criando uma sensação de familiaridade.
Mas os próprios desenhos do Sr. Toriyama iam ficando cada vez mais fofos com o tempo, então acompanhar essas mudanças era complicado. Era como se o design dos personagens tivesse que ser constantemente ajustado ao estilo original. Na época, também estávamos trabalhando em filmes*¹, então os personagens foram mudando aos poucos a partir daí. Naquele momento, já estávamos fazendo os designs com um estilo ainda mais próximo ao desenho do Sr. Toriyama.
Arale-chan é divertida tanto de assistir quanto de desenhar.
Naquela época, eu realmente não me preocupava com os índices de audiência. Mas dava pra perceber que o anime era popular. Havia muitas bonecas e produtos à venda nas lojas, e até celebridades imitavam os óculos da Arale. Virou quase uma tendência da época — os óculos estavam em todo lugar. Mas mais do que isso, o que eu realmente gostava era de poder desenhar os personagens do Sr. Toriyama.
Meu personagem favorito, claro, é a Arale-chan. Mas também gosto bastante do Gatchan. E do Rei Nikochan. Eu também era fã do Seiyuu⁶ Otake-san. Em termos de design, talvez o meu preferido seja o Time-kun. O professor Kurigashira também é interessante… se é que dá pra dizer que ele é “interessante” (risos).
Durante a produção, não houve nenhum personagem que eu desgostasse de desenhar. Dr. Slump é, de todo modo, uma obra extremamente divertida. Acho que dá pra assistir várias vezes sem enjoar. Quem comprou o anime, com certeza fez uma boa escolha. Cada personagem tem seu próprio “brilho” especial. Uns são completamente malucos, outros absurdamente imprevisíveis, como o lado pervertido do Senbei ou o Suppaman, que é absurdamente convencido… Cada um tem sua graça. E ver todos esses personagens malucos reunidos é o que torna tudo ainda mais divertido.
O que mais ficou marcado pra mim foi, claro, o episódio 1. Acho que foi a primeira vez que assisti a uma primeira exibição*² e realmente ri. Todo mundo assistiu junto e caiu na gargalhada, foi um “wahaha!” geral. Eu gostaria que o Sr. Toriyama desenhasse algo ainda mais absurdamente divertido. Queria ver o estilo atual dele — queria ver qual é a visão de mundo que ele tem agora, na casa dos 50 anos. Mesmo que fosse pela internet, queria que ele publicasse algo assim. Mesmo que a Shueisha não deixasse, só de ler um capítulo já estaria feliz (risos).
*1 Filmes.
Foram produzidos ao todo noves filmes, começando com “Hello! Wonder Island” em 1981.
Além disso, um curta-metragem de aproximadamente 5 minutos foi exibido em 2007 junto com o longa-metragem “One Piece: Episódio de Alabasta – A Princesa do Deserto e os Piratas”.
*² Shogō (初号) – Exibição da primeira versão finalizada.
Refere-se a uma exibição especial feita para a equipe de produção e patrocinadores,
com o objetivo de realizar a verificação final do episódio ou filme antes da transmissão ou lançamento oficial.
Entrevista com a Equipe
Roteirista
Profile
Ela trabalhou em uma ampla variedade de obras, desde Shonen como Dragon Ball e One Piece, até comédias românticas como Maison Ikkoku e Urusei Yatsura, e também em títulos do Sekai Meisaku Gekijo, como Romeo no Aoi Sora. Seu trabalho mais recente foi em Nanatsuiro★Drops, como compositora da série.
Michiru Shimada
“Fiquei conhecida como a roteirista que nasceu das costelas da Arale.”
Um ambiente animado e divertido, e às vezes cheio de paixão.
“Dr. Slump Arale-chan” foi o meu trabalho de estreia. Li e decorei com muito esforço a primeira metade do roteiro de Arale-chan, que havia sido escrito pelos meus senpais… Se bem me lembro, o primeiro episódio era a história do Parzan*¹.
Recebi esse roteiro com mais de meio ano de antecedência da data de exibição, e só consegui terminá-lo depois de revisá-lo várias e várias vezes, então é uma lembrança muito marcante. O Shichijou-san me ajudou revisando palavra por palavra… sou muito grata por todo o apoio (risos).
Arale-chan não tinha uma tabela de estrutura da série, sabe? A gente se reunia, conversava animadamente, e quando as ideias se organizavam até certo ponto, decidíamos: “Vamos com isso mesmo!”, e aí o Shichijo-san fazia o pedido oficial do roteiro.
O Shichijo-san era realmente como o Senbei: dizia “Eu sou um gênio!” e ainda assim conseguia coordenar tudo direitinho. Ele cuidava muito bem de todos, e vivia oferecendo comida pra gente (risos).
Só o grupo dos roteiristas já se reunia bastante pra beber ou jogar torneios de mahjong. Como esse foi o trabalho de estreia meu e do Inoue-san*², recebemos muitos ensinamentos dos veteranos, como o Yukimuro-san*³ e o Koyama-san — desde como escrever roteiros até coisas sobre a vida mesmo.
A gente discutia personagens dizendo coisas como: “O Suppaman é assim” ou “Essa parte do Toriyama-san é incrível”, e íamos aprofundando os personagens. Acredito que a personagem Vovó Oharu-san*⁴ tenha surgido justamente desse tipo de conversa.
O que a gente mais valorizava ao criar os episódios era passar uma sensação de calor e leveza, algo que fizesse o público se sentir acolhido. Acho que todos da equipe tinham esse mesmo sentimento. E acredito que essa atmosfera animada e divertida do bastidor acabou aparecendo no próprio anime também.
Arale-chan é minha favorita, mas é difícil lidar com ela.
“Dr. Slump” já era muito comentado antes mesmo de eu começar a trabalhar nele. Era um estilo de arte pop que não parecia japonês, mas também não era americano — era uma visão de mundo única. E o estilo de humor também era bem original, então eu fiquei atento à obra.
A Arale-chan é a minha favorita… Acho que o lado mais puro do Toriyama-sensei se revela nela. Mas, para ser sincero, ela é uma personagem difícil de trabalhar na hora de criar a história (risos).
Ela só diz “Kiin”, cutuca o cocô e fala “N’Cha!”. Só isso não é suficiente para criar uma história de 30 minutos, então são necessárias ideias extras, truques… exige várias camadas de criatividade a mais do que um drama comum. Você precisa de um evento que desencadeie uma bobagem da Arale e também das reações a ela… do ponto de vista do roteiro, é bem difícil. Dentro desse cenário, o episódio “Pusu Pusu, Hafu hafu”*⁵ é, na verdade, a única história que escrevi com a Arale como personagem principal. A ideia era justamente mostrar a Arale só brincando — escrevi com a imagem tranquila e calorosa de uma criança soprando um dente-de-leão. E o Ashida-san*⁶ deu uma direção maravilhosa ao episódio, e isso ficou guardado como uma lembrança muito querida para mim.
Ao contrário da Arale, o Senbei-san era bem fácil de lidar. O engraçado é como a Arale vai frustrando os desejos dele um por um. Ela faz tudo sem maldade nenhuma, só sendo inocente e causando aquela bagunça, enquanto o Senbei acaba desanimado… Essa é a fórmula de ouro entre os dois. Mas o mais legal é que, mesmo se dando mal o tempo todo, ele nunca pensa em desistir. Solta logo um “Eu sou um gênio!” — é a cara do Shichijo-san, né?
O episódio final cheio de entusiasmo e solidão.
Entrei na série no meio do segundo ano, então nunca imaginei que teria a honra de escrever o episódio final. Quando recebi o convite, fiquei muito feliz, mas também veio a tristeza de pensar “vai mesmo acabar…”, além da pressão de ter que escrever algo realmente bom — lembro que mergulhei com tudo na escrita.
Coloquei todos os personagens no episódio e encerrei de forma bem animada. Foi um momento de pura emoção. Escrevi quatro episódios ao longo da série, e me esforcei intensamente em cada um. Senti na pele a dificuldade de construir algo do zero. Dizem até que nasci das costelas da Arale e realmente, sinto que nesses quatro episódios aprendi tudo o que é essencial para ser uma boa roteirista.
*1 “Parzan, o Rei da Selva” (episódio 42), incluído na “Edição Ncha”.
Parzan, que se autoproclama rei da selva mas é ridicularizado pelos animais, enfrenta Suppaman em um duelo direto.
*² Inoue-san = Toshiki Inoue,
roteirista conhecido por seu trabalho na série Kamen Rider – Era Heisei -, entre outras. É da mesma geração que ela e estreou com este projeto.
*³ Yukimuro-san = Shunichi Yukimuro, roteirista.
Estreou em roteiros de anime com Jungle Taitei e permanece ativo até hoje, escrevendo para obras como Sazae-san.
*⁴ Algumas novas características foram adicionadas apenas no anime, como a Vovó Oharu possuir “poderes espirituais”.
No episódio 170, “A Grande Guerra Yokai da Oharu-san!”, é contada uma história em que ela enfrenta criaturas sobrenaturais.
*⁵ “Festival Infantil Pusu Pusu, Hafu Hafu“ (episódio 54), incluído na “Edição Ncha”.
Neste episódio, Arale se encanta ao experimentar takoyaki pela primeira vez.
*⁶ Ashida-san = Toyoo Ashida, diretor.
“Pusu Pusu, Hafu hafu” é um episódio com poucos diálogos, mas que se destaca pelas animações fofas, com um estilo visual que lembra um livro ilustrado.
Entrevista com a Equipe
Editor
Profile
Editor responsável pelas obras de Akira Toriyama Dr. Slump e Dragon Ball. Mais tarde, tornou-se o primeiro editor-chefe da revista V-Jump, ocupou o cargo de editor-chefe da Weekly Shonen Jump, chefiou a Divisão de Direitos e atualmente é diretor da Shueisha.
Kazuhiko Torishima
“Não o melhor, mas o maior”
500 storyboards desenhados durante o período de preparação.
Meu primeiro encontro com o Toriyama-san foi quando eu, como membro da equipe de seleção do prêmio mensal de mangá, avaliei os manuscritos enviados. Naquela época, eu ainda nem era supervisor. Lembro que meu superior escolheu outro artista, enquanto eu escolhi Toriyama-san. A obra que ele enviou era uma paródia, então acabou não recebendo o prêmio. Mas, mesmo assim, o motivo pelo qual eu a escolhi foi simples: o desenho era excepcional.
O que me chamou mais atenção foi o uso de letras — todos os efeitos sonoros e textos desenhados à mão estavam em caracteres ocidentais, com um belíssimo trabalho de lettering⁷, Eu nunca tinha visto algo assim antes. Foi realmente uma experiência nova e marcante.
Desde a primeira vez que vi aquele manuscrito, tive certeza de que ele poderia estrear. Mandei um telegrama e pedi para que viesse a Tóquio. Foi aí que nos encontramos pessoalmente pela primeira vez.
Minha primeira impressão foi: Ele era claramente alguém muito inteligente. Como editor, posso dizer que tive sorte. Afinal, desenhar bastante faz com que a maioria das pessoas melhore no traço até certo ponto. Mas criar boas histórias, escrever diálogos naturais — isso depende do domínio da língua, e não é algo fácil de ensinar como editor. No caso dele, eu não vi só talento visual, já naquela época, dava para perceber que ele também tinha competência linguística. Mais tarde, quando conversamos sobre isso, ele me contou que tirava boas notas em japonês.
Depois disso, pedi que ele continuasse desenhando names⁸. Eu também era um editor iniciante, e ele, um mangaká novato — então os dois estavam aprendendo juntos. Ele estava desempregado, precisava de alguma saída, então começou a desenhar mangás copiando o que via. Mas, no começo, parecia que ele ainda não entendia bem como construir um mangá de verdade. Por isso, pedi que fosse aprendendo a fazer mangá enquanto desenhava. Quando Dr. Slump nasceu, ele já tinha acumulado 500 páginas de names. E essas 500 páginas acabaram se tornando a base para praticamente todas as ideias usadas depois em Dr. Slump.
O motivo de ele ter conseguido continuar a série, mesmo com a rotina tão puxada, foi porque já tinha esse enorme estoque. Nada daquilo foi desperdiçado — tudo foi aproveitado. Aliás, essas 500 páginas não eram names no sentido tradicional: eram shitagaki⁹. Ele não faz ekonte¹⁰. Então, se precisasse mudar algo, teria que redesenhar todo o esboço do zero. Eu até cheguei a dizer que esse método era ineficiente, mas ele nunca quis mudar. Dizia que, se não fosse assim, ele não conseguia visualizar a ideia.
Dr. Slump é uma obra que surgiu naturalmente a partir daquelas 500 páginas que ele desenhou no início. Não foi algo que eu tenha pedido especificamente para ele desenhar.
Mangás em que o editor fica dizendo “faça isso, faça aquilo” acabam sendo obras pensadas com a cabeça do editor — e por isso, há um limite para o quanto podem ser realmente interessantes.
Eu acredito que o mais importante em uma reunião editorial é saber como organizar e lapidar o que o autor traz espontaneamente. Por isso, Dr. Slump é basicamente feito daquilo que estava na cabeça dele desde o começo. Por exemplo: por que a Vila Pinguim tem aquele clima tão peculiar? Quando visitei a casa dele, entendi na hora. A região onde ele mora era exatamente a própria Vila Pinguim. Aquele ar tranquilo e sossegado está todo ali.
Naquela época, a Jump era dominada por mangás de “espírito de luta”. Mas eu achava que o mangá podia assumir várias formas diferentes. E, acima de tudo, tinha a sensação de que a comédia romântica estava prestes a estourar. Essa percepção ficou clara quando li Nakimushi Koshien*¹, uma obra anterior a Nine*², criada por Adachi Mitsuru em parceria com Yamazaki Juzo. Na hora pensei: “Isso aqui vai ser grande!”. Já era possível prever que o boom das comédias românticas estava vindo.
Foi por isso que incluí a Arale em Dr. Slump. Eu sabia que estávamos prestes a entrar na era das garotas.
Um fenômeno que conquistou todas as gerações.
Quando a serialização começou, Slump já estreou em segundo lugar nas pesquisas de popularidade. E olha que nem estava na capa, nem tinha páginas coloridas de abertura. Mesmo assim, fiquei com aquela sensação de “Conseguimos!”.
Foi um segundo lugar conquistado naturalmente. E no terceiro capítulo… alcançou o primeiro lugar. Dr. Slump era realmente apoiado por todos os públicos — crianças, adultos, homens, mulheres. Os mangás que ficam entre os primeiros colocados no ranking são, sem exceção, aqueles que têm o apoio de todas as faixas etárias. Sem isso, é impossível chegar ao topo.
Durante a serialização, havia três coisas com as quais eu me preocupava o tempo todo: A primeira era como deixar o name que estava bem diante de mim o mais interessante possível. Afinal, o name é a alma do mangá; Segunda era a saúde. Saber gerenciar o cronograma e manter o corpo funcionando. Uma serialização semanal é absurdamente puxada; Terceira era como manter a motivação em alta. Essa, talvez, fosse a parte mais difícil. Afinal, publicar capítulos semanais originais é um trabalho árduo.
Naquela época, a Jump era sustentada quase inteiramente por Dr. Slump, até a estreia de Sutoppu!! Hibari-kun!*³. Hibari-kun! chegou e já conquistou o primeiro lugar logo de cara, mas… o Eguchi Hisashi (risos) fazia muitas pausas. No fim, a revista continuou dependendo de Slump por um bom tempo. E ainda teve a estreia do anime na TV, que virou um fenômeno com altíssimos índices de audiência, um boom gigantesco. Com isso, as páginas coloridas dedicadas ao título aumentaram muito e isso também deu um baita trabalho.
Desafios e memórias da estratégia de transmediação.
Quando a adaptação para anime foi decidida, pude dar muitas opiniões durante os três primeiros meses. Naquela época, a Shueisha ainda não tinha um sistema interno de gestão de licenciamento, e quase ninguém na equipe editorial entendia de anime. Tivemos que reunir todos os envolvidos para entender se era realmente viável produzir uma animação. E, no meu caso, fui aprendendo tudo na marra, errando e acertando na prática. Também precisei pensar, do zero, em como exatamente se faz um anime.
Até então, os editores não tinham o hábito de pensar em transformar uma obra em anime e depois refletir isso de volta na revista. A ideia predominante era que o anime acabava desgastando a obra original. Mesmo quando um título era adaptado para TV, ninguém pensava em uma estratégia multiplataforma. Mas eu acreditava firmemente: cada imagem animada, cada crédito com o nome “Akira Toriyama”, cada menção a “Slump”, tudo isso retornaria para a obra original.
Por isso, eu achava que o lado do mangá, o lado original, precisava estar envolvido em tudo e assumir responsabilidade total. No fim das contas, somos nós que temos um compromisso com o leitor. E por isso, não podemos relaxar nem por um segundo.
Falando em lembranças relacionadas ao próprio anime, as músicas da Mizumori Ado eram muito boas. Especialmente a música de abertura — era realmente ótima. Uma canção excelente.
Hoje em dia, já não existem mais músicas de anime tão puras assim. E também, a redação recebia amostras de produtos, mas era uma quantidade absurda. Vinham umas quatro caixas de papelão enormes, tudo de uma vez. Eu tinha que organizar tudo sozinha. Foi bem puxado. Eu pensava: “Como é que conseguiram fazer tanta coisa assim?”.
Até hoje me lembro de um dia quente de verão em que, por mais que eu trabalhasse, o conteúdo das caixas simplesmente não diminuía. E, pessoalmente, fiquei muito feliz que o Seiyuu do Dr. Mashirito tenha sido um ator com voz de galã. Foi o Nachi Nozawa. Durante a época em que eu estudava para os vestibulares, eu costumava ouvir os programas noturnos dele no rádio. Um deles era o “Nacchan Chakochan no Pack-in Music”*⁴.
A história secreta do nascimento do Dr. Mashirito.
Falando sobre o Dr. Mashirito, é algo que ainda hoje me deixa profundamente arrependido. Pensei: “Fui pego nessa”. Houve um episódio em que um cientista maluco ia aparecer, mas o primeiro personagem que ele desenhou… não tinha impacto nenhum. Então, ao dar o feedback, eu disse algo como: “Quero que você desenhe alguém realmente malvado, alguém que você odeia de verdade”. E então, ele apareceu com o Mashirito.
Pra piorar, ele é bem esperto — mandou o manuscrito no limite do prazo, bem em cima da hora, de propósito, pra não dar tempo de pedir nenhuma correção. Se o personagem não tivesse feito sucesso, teria sido o fim da linha — mas ele acabou ficando popular, então não teve jeito.
Como editor, quando um episódio faz sucesso, tudo que posso fazer é dizer: “Faz a Parte 2 e continua nessa linha!”. No fim, ele acabou se tornando o único vilão fixo da série.
Por causa disso, cheguei até a ser abordado por desconhecidos em pistas de boliche e lugares assim.
Sobre o motivo de eu ter usado cabelo afro é que, naquela época, a febre das permanentes tinha tomado conta da redação. E, pra piorar, meu cabelo era liso como o do Ryunosuke Akutagawa, caía reto pra baixo o tempo todo. Quando eu estava trabalhando, era um saco — super incômodo — então acabei fazendo uma permanente. Foi por praticidade mesmo.
O segredo por trás desse sucesso sem precedentes.
Quando penso no motivo pelo qual Dr. Slump se tornou um sucesso tão extraordinário, acho que foi porque era algo realmente novo. Até então, os mangás mais comuns como Kyojin no Hoshi ou Ashita no Joe eram histórias dramáticas com confrontos intensos, cheias de um clima masculino carregado.
Até mesmo os desenhos tinham esse tom pesado e suado, bem masculino. E foi nesse cenário que surgiu algo completamente diferente: um mangá extremamente simples, com traços limpos e precisos, em que cada quadro, isoladamente, parecia cuidadosamente desenhado como parte de um design visual. Esse era Slump.
As ilustrações coloridas originais eram tão bem feitas que ninguém tinha visto nada parecido antes. A leitura era divertida, mas mesmo só de olhar, já dava prazer. Foi isso que permitiu à obra atrair até mesmo quem nunca tinha lido mangás voltados ao público masculino. Quando algo é realmente bom, ele tem um poder de se espalhar universalmente. Slump ultrapassou as fronteiras da própria Shonen Jump.
Desde o seu lançamento, conseguiu conquistar um público que nunca tinha lido mangá shonen — gente que nunca tinha sequer aberto uma Jump. Na época, a tiragem da primeira edição de Slump chegou a superar a da própria Shonen Jump.
O futuro que Dr. Slump previu.
Seja no mangá original ou no anime, o charme de Dr. Slump está na graça das interações entre personagens que parecem comuns, mas que são únicos — é um tipo de personagem que “quase existe”, mas não existe. E também na diversão do mundo que os cerca. Para quem for assistir ao DVD Box, espero que possa saborear justamente isso.
Hoje em dia, tem uma quantidade absurda de programas de comédia e variedades na TV, né? Eu tenho a sensação de que Dr. Slump meio que previu que um mundo assim acabaria surgindo. Um monte de personagens engraçados, interagindo entre si, brincando de várias formas — e só isso já é divertido o bastante por si só. A questão é: como empacotar isso e apresentar ao público?
A maioria dos programas de TV hoje em dia é basicamente construída em cima disso. Por isso, acho que Slump realmente antecipou esse tipo de era. Rever Dr. Slump sob esse ponto de vista pode ser bem interessante, não acha?
Akira Toriyama: Um talento raro.
Eu vi cada quadro, página por página, de todo o manuscrito de Dr. Slump. Em termos de ritmo e traço, tem uma força explosiva. Naquela época, ele tentava desenhar de uma vez só a imagem que tinha na cabeça, colocando tudo no papel num curto espaço de tempo. Enquanto Dragon Ball, obra que ele criou sozinho em tão pouco tempo, é extremamente refinada, Slump tinha uma intensidade, uma velocidade e uma pressão esmagadora que só o Toriyama daquela época podia alcançar. Desenhar algo com essa potência é, honestamente, impossível de imaginar. Já acompanhei vários artistas, mas acredito mesmo que Akira Toriyama é um verdadeiro gênio.
Mesmo que existam no Japão autores mais populares e conhecidos que ele, acredito que, no cenário mundial, ninguém o supere.
Dramas com um estilo tipicamente japonês às vezes não funcionam no exterior. Então, o que realmente funciona é apenas o que é universal. E o que é universal? São a arte e os personagens. Isso é a essência do mangá shonen. Em especial, a imagem dos personagens tem uma capacidade de propagação excepcional. Acho que isso é a prova do verdadeiro poder dele como mangaká. Na minha opinião, Akira Toriyama não é só o melhor, ele é o maior.
*1 Nakimushi Koshien.
Ilustrado por Adachi Mitsuri, baseado na história de Yamazaki Juzo.
Um mangá de comédia romântica + beisebol estrelado por um técnico de time de beisebol. Weekly Shonen Comic, 1977.
*² Nine.
Escrito por Adachi Mitsuru, Edição Especial Shonen Sunday, 1978-1980
*³ Sutoppu!! Hibari-kun!.
Escrito por Eguchi Hisashi, 1981-1983.
Um mangá de comédia sobre um belo jovem crossdresser chamado Hibari-kun.
Apesar de seu enorme sucesso, a série foi cancelada abruptamente após dois anos, ficando inacabada.
*⁴ Nacchan Chakochan no Pack-in Music foi um programa de rádio da TBS transmitido nas noites de sexta-feira entre 1967 e 1982, como parte do programa “Hack-in Music”.
Era apresentado por Nozawa Nachi e Shiraishi Fuyumi, sendo popularmente conhecido pelas abreviações “Nacchakoback” ou “Kinba”.
Glossário
- ESS (English Speaking Society): Grupo estudantil para prática do inglês;
- Dokkoi Daisaku: Série de TV (1973-1974);
- Chanson: Estilo musical francês com letras poéticas;
- Sanko no Rei: Momento famoso no romance “Romance dos Três Reinos”, onde o senhor da guerra Liu Bei visita por três vezes o sábio estrategista Zhuge Liang para convencê-lo a se juntar à sua causa;
- Deformê (デフォルメ): Estilo de desenho exagerado/caricato;
- Seiyuu (声優): Termo para Ator de voz, referindo-se aos profissionais que dão vozes aos personagens;
- Lettering: Arte de desenhar letras e não apenas escrever;
- Name (ネーム): Equivalente aos Storyboards dos mangás;
- Shitagaki (下描き): Equivalente aos esboços, quase pronto para a arte-final;
- Ekonte (絵コンテ): Quadros simples com descrições.