Patapon 1+2 Replay – Análise

Patapon 1+2 Replay – Análise

Nos final dos anos 1990 e parte dos 2000, os jogos rítmicos ocupavam um lugar peculiar no cenário dos videogames. Longe de serem um gênero dominante, eram experiências raras, escassas, mas diferenciadas. Ao contrário dos jogos de ação, RPGs ou plataformas, que formavam o grosso das prateleiras das lojas e locadoras, os títulos baseados em ritmo ousavam dentro de um mercado ainda tímido em abraçar formas alternativas de jogabilidade. E, claro, fidelizavam um público.

Jogos rítmicos exigiam que o jogador abandonasse o controle tradicional baseado em reflexo direto ou cálculo estratégico, e passasse a interagir com o jogo por meio da escuta, da repetição e até mesmo do corpo, se estruturando mais como performances do que como desafios espaciais. Isso meio que tornava sua recepção incerta, especialmente em mercados fora do Japão, onde o experimentalismo lúdico de games como Parappa the Rapper (1996) ou Bust a Groove (1998) era visto como exótico ou excêntrico demais para o mainstream.

Ainda assim, foi justamente esse caráter excêntrico que deu a esses jogos uma aura de culto. Parappa, por exemplo, introduziu mecânicas baseadas na cadência vocal e na memorização rítmica. Bust a Groove (1998) levou o gênero para um território competitivo, misturando dança rítmica, comandos com janelas de precisão mais rígidas, arenas 3D, motion capture e “golpes” especiais para sabotar o adversário, um híbrido raro que mostrava como o ritmo podia dialogar com o formato de duelo. Já Space Channel 5 (1999), com sua repórter intergaláctica dançante e estética retrofuturista, unia ficção científica kitsch e jogabilidade musical com um charme que beirava o surreal.

A partir dos anos 2000, esse campo começou a se expandir, sobretudo com o surgimento de jogos como Dance Dance Revolution (1998, popularizado nos anos seguintes), que levaram o ritmo literalmente ao corpo, introduzindo o tapete de dança como periférico. Foi uma das primeiras vezes em que a fisicalidade do jogador se tornava parte integral da mecânica (pelo menos a mais popular), dominando os fliperamas da época. Já Guitar Hero (2005) e Ouendan (2005) traduziram o ritmo para interfaces mais intuitivas ou histriônicas, com instrumentos de brinquedo ou comandos em tela sensível ao toque, respectivamente.

Patapon entra como um dos ápices dessa linhagem de jogos rítmicos, embora longe de ter sido o produto mais bem sucedido desse gênero, título que indiscutivelmente pertenceu a Guitar Hero. Lançado originalmente em 2007 para o PlayStation Portable (PSP), Patapon não apenas consolidou o potencial dos jogos baseados em ritmo, como também o reinventou ao fundi-lo com gêneros que, até então, pareciam incompatíveis com a cadência musical: estratégia em tempo real e RPG.

Ao contrário de Parappa ou Guitar Hero, que colocavam o ritmo como fim, seguindo a batida para “dançar”, “cantar” ou “tocar”, Patapon o transformava em linguagem de comando. Você não tocava música para pontuar ou acompanhar um personagem, você era o regente de um exército inteiro, guiando uma tribo por meio de tambores rituais. Comandando os Patapons, uma tribo de pequenos guerreiros em forma de globo ocular, você avança no jogo digitando sequências de botões que seguem comandos rítmicos. Cada botão corresponde a um golpe de tambor: “Pata”, “Pon”, “Chaka” e “Don”. Em sequência, essas batidas são interpretadas como ações como atacar, defender, avançar ou recuar, e quanto mais preciso você for, mais rápido alcança o modo “Fever”, onde suas tropas ganham mais força.

Os Patapons são descendentes de guerreiros quase invencíveis, fortalecidos pelos tambores sagrados de seu deus, o “Todo-Poderoso”. Expulsos de sua terra natal pelo Império Zigoton (uma civilização rival liderada pela Rainha Kharma e pelo general Gong, o “Olho de Falcão”), os Patapons embarcam em uma jornada mística em busca de “IT”: um enigma sagrado que promete contentamento eterno a quem o alcançar. O jogador assume o papel do deus reencarnado que guia a tribo por meio do ritmo, despertando suas forças adormecidas.

Patapon venceu diversos prêmios em seu lançamento original, incluindo Melhor Design Artístico e Melhor Trilha Sonora Original no IGN’s Best of 2008, além de ter sido eleito o Jogo do Ano para PSP por diversos veículos.

Os sons “Pata”, “Pon”, “Chaka” e “Don” eram palavras de ordem. Atacar, marchar, defender, recuar. Tudo era feito dentro de um compasso. E errar o ritmo era como errar a liderança. A sensação de controlar uma legião com simples toques reverbera como um ritual tribal hipnótico foi tão marcante que os ritmos permaneciam na mente do jogador dias depois. Quem jogou, certamente ficava cantarolando sozinho por aí “Pon, Pon, Pata, Pon”.

Dado seu sucesso, mais outros dois títulos foram lançados também para o PSP e eis que, em 2025, a Bandai Namco traz Patapon 1+2 Replay, uma coletânea que revive as duas primeiras joias dessa franquia do PSP, agora remasterizadas para PlayStation 5, Switch e PC.

O charme do primeiro Patapon reside na sua simplicidade minimalista, com mapas em 2D, globinhos simpáticos e carismáticos, e comandos de ritmo fáceis de aprender, mas difíceis de dominar. Já Patapon 2 evolui significativamente o que já era muito bom no primeiro, ao introduzir árvores de evolução que permitem a especialização de unidades, novos tipos de inimigos, biomas variados, além de um sistema de gerenciamento de recursos mais claro que o primeiro. Tanto o primeiro quanto o segundo jogo incentivam a estratégia no posicionamento das tropas e a composição de exércitos balanceados para superar as fases que são apresentadas em uma historinha contínua.

A trilha sonora é, sem dúvida, o coração da experiência, com sons dos tambores marcantes ou nostálgicos, além dos cânticos dos Patapons, que combinam com a música que acompanha as batalhas. Tudo é elaborado como se você visse o som. A ostentação sonora do Patapon 1 é hipnotizante, assim como no Patapon 2, com músicas tribais que grudam na cabeça e que são a identidade do jogo.

Mesmo sendo uma coletânea remasterizada, Patapon 1+2 Replay não inventa muito além dos originais. A qualidade gráfica e sonora está bem preservada, mas faltam recursos modernos esperados hoje, como autosave, galerias de arte, trilha sonora acessível ou modos extras, o que torna a experiência um pouco decepcionante. Mas um dos problemas mais notáveis reside no input lag, especialmente em televisores modernos. Diferentes sistemas de áudio e vídeo podem desalinhar o ritmo visual e sonoro, e a adaptação exige ajustes manuais, o que pode tornar para alguns (não todos) uma experiência bastante frustrante durante longas sessões no modo dock ou com fones Bluetooth. Cabe lembrar que não é regra, mas pode acontecer.

Outro ponto delicado, porém fruto dos jogos originais, é o seu grind um tanto artificial, principalmente no Patapon 2, onde há barreiras que exigem repetição de fases anteriores para reunir recursos ou evoluir unidades, podendo quebrar o ritmo e tirando a sensação de novidade durante a campanha.

Apesar dessas limitações, Patapon continua uma das experiências mais únicas da história dos videogames. É fácil de pegar, mas difícil de dominar, ao mesmo tempo que combina um visual encantador (que já impressionava na antiga telinha do portátil da Sony), design sonoro obsessivo e ritmo estratégico que se tornam inesquecíveis. Mesmo com alguns atritos técnicos na portabilidade, a experiência central brilha.

Talvez o maior mistério seja a ausência de Patapon 3, ainda preso a um hardware antigo. Seu não comparecimento torna a coletânea incompleta, o que pode frustrar fãs que esperavam finalmente ver toda a trilogia em um só lugar. Ainda assim, para quem já marchou ao som de “Pata, Pata, Pata, Pon”, ou para quem nunca ouviu esse chamado hipnótico, Patapon 1+2 Replay pulsa forte.

Patapon 1+2 Replay é uma coleção nostálgica e vibrante, um testemunho de como criatividade, som e jogabilidade podem se unir numa experiência profundamente original. Se você é fã de experiências musicais interativas, é difícil encontrar algo similar hoje. Para novos jogadores, é uma porta de entrada encantadora a um universo absurdo e bem calibrado; para veteranos, uma chance de revisitar aquela dança tribal com os olhos brilhando mais uma vez.

Nota: 9,5

 

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