A Última Entrevista entre Akira Toriyama e Kazuhiko Torishima (Técnicas Definitivas de Mangá do Dr. Mashirito)

As Técnicas Definitivas de Mangá do Dr. Mashirito (21 de julho de 2023)

Entrevista Definitiva Vol. 1: Akira Toriyama x Kazuhiko Torishima

 

Como um projeto especial exclusivo do Técnicas Definitivas de Mangá, apresentamos as últimas conversas entre Kazuhiko Torishima e três cartunistas populares que fizeram dupla com ele. Nosso primeiro convidado é Akira Toriyama, a lenda do mangá de renome mundial. Encontrando-se cara a cara pela primeira vez em uma década, a dupla terá a conversa definitiva sobre os assuntos Dr. Slump e Dragon Ball.

 

“Disseram-me que tudo o que fiz foi ‘brincar’, então isso me deixou feliz”

Torishima:
A primeira vez que conheci Toriyama-kun foi no meu segundo ano depois de ingressar na Shueisha. Isso foi na sua segunda participação no concurso mensal “Young Jump Award”.

Toriyama:
Minha primeira inscrição foi Awawa World, e a segunda foi Mysterious Rain Jack. Foi quase inteiramente uma paródia de Star Wars, já que era o grande sucesso da época. (risos) Era uma história sobre o rapto do deus do trovão para provocar uma seca e depois ganhar dinheiro vendendo água (imagem 1).

Imagem 1: A criança Deus do Trovão conforme apareceu no one-shot PINK de 1982.

Torishima:
Você publicou histórias semelhantes aqui e ali depois, não foi?

Toriyama:
É um assunto do qual gosto – acabou sendo usado até na série Sand Land.

Torishima:
O envio não foi selecionado. Mas as partes escritas à mão eram realmente boas. O senso de design era refinado e chamou minha atenção.

Toriyama:
Eu comecei em uma agência de publicidade, então conseguia ao menos fazer isso.

Torishima:
Exceto que havia o fato de que esse tipo de coisa era raro, e também – e isso é verdade para mim até agora – eu odeio quando as linhas são irregulares ou a arte é pobre.

Toriyama:
Então, ele entrou em contato comigo. Meus pais ficavam me dizendo que tudo que eu fazia era “brincar”, então isso me deixava feliz, embora nem tanto, já que eu estava nisso por dinheiro… (risos)

Torishima:
Afinal, você não poderia receber o prêmio em dinheiro se não fosse selecionado. (risos)

 

Quais foram suas impressões um do outro quando se conheceram?

Toriyama:
Como um flamingo magro e enérgico. (risos) Ele também era um falastrão. Prefiro pessoas que dizem o que querem do que pessoas educadas, mas inescrutáveis, então acho que esse ponto, pelo menos, funcionou surpreendentemente bem comigo.

Torishima:
Toriyama-kun era uma pessoa comum (imagem 2), no bom sentido. Afinal, existem muitos cartunistas novatos que são caladões ou têm inclinações extremamente fortes, o que me fez pensar: “Eu realmente não quero trabalhar com esse tipo de pessoa”.

Imagem 2: Akira Toriyama na sua primeira aparição em Dr. Slump. Ele realmente é “uma pessoa comum”(?)!

Você sempre leu muitos quadrinhos desde a infância?

Toriyama:
Eu estava realmente vidrado neles no ensino fundamental, mas depois disso, meus interesses gravitaram em torno de filmes e arte, então parei de ler quadrinhos. Eu assistia praticamente qualquer coisa, exceto romance, começando com Faroeste Macarrônico.

Torishima:
Isso realmente aparece em Dr. Slump, com paródias idiotas de filmes, como Dirty Harry.

Toriyama:
Eu também gostava mais de programas de TV live-action do que de animação, e fiquei entusiasmado com Ultra Q e Ultraman, que vi quando estava no ensino fundamental.

Torishima:
Em Dr. Slump, o que me surpreendeu foi como você não incluiu Arale no storyboard inicial do segundo capítulo. “Por que aquela garota fofa e engraçada não aparece?” Perguntei a ele e ele disse: “Ela é apenas uma das invenções de Senbei, então só existe em um capítulo”.

Toriyama:
Eu também fiquei confuso quando você disse: “Faça daquela garota a personagem principal”. Eu fiquei tipo: “O quê?”

Torishima:
Então ele disse: “Não quero”. E quando perguntei por quê, ele me disse: “Porque é uma história em quadrinhos para meninos”.

Toriyama:
Os homens da era Shouwa [o reinado do Imperador Hirohito, 1926–1989] eram exigentes em relação à masculinidade, então eu realmente não queria ter uma garota como protagonista.

Torishima:
Então fiz uma aposta com Toriyama-kun. Eu disse: “Desenhe uma história em quadrinhos com uma garota como protagonista na edição extra da Jump, e se ela não ficar entre os três primeiros no ranking de popularidade, você não precisa fazer de Arale a personagem principal”. Essa história foi Tomato Girl Detective (imagem 3).

Toriyama:
Eeerr… Esta é outra obra que prefiro esquecer…

Imagem 3: Tomato Girl Detective: One-shot de 1979. Uma comédia maluca em que a detetive Tomato, de 18 anos, cria problemas.

“Fiquei sem material de reserva logo no início!”

Torishima:
E então, ficou em um impressionante terceiro lugar. Pedi para ele colocar Arale do segundo capítulo em diante e enviei os três primeiros capítulos que ele desenhou para uma reunião de serialização. Mas o vice-editor-chefe da época (Shigeo Nishimura) costumava fazer exigências irracionais, então, embora a série tenha sido escolhida, ela não estava em cores completas no início da revista, nem na capa. Pelo contrário, juntaram os dois primeiros capítulos naquela primeira semana sem nos consultar.

Toriyama:
Isso mesmo! Fiquei sem material de reserva logo no início.

Torishima:
Isso foi um choque, fazer de “dois capítulos de uma só vez” um argumento de venda. E então alcançou o topo do ranking de popularidade com o terceiro capítulo, e do nada ele nos disse: “Desenhe um capítulo colorido para as páginas iniciais”.

Toriyama:
Fiquei feliz com isso, mas também em conflito. Quando comecei a desenhar a série, perguntei: “Terei que continuar fazendo isso toda semana?” e você me disse: “Você vai ficar bem. Se não for popular, acabará em 10 semanas”, mas de repente fui jogado no inferno. Eu nem tinha assistente, então só conseguia dormir uma hora por dia. Inicialmente, fui bastante exigente com a pintura, mas gradualmente descobri maneiras de economizar tempo. (risos)

Torishima:
Então, cerca de seis meses depois de Dr. Slump, você começou a reclamar.

Toriyama:
Eu simplesmente não conseguia imaginar por quanto tempo seria capaz de continuar cerrando os dentes daquele jeito. Ter que fechar tudo em um único capítulo todas as vezes foi realmente cansativo.

Torishima:
Ao longo do caminho, você começou a fazer coisas como competições de atletismo e torneios de “chute a lata”.

Toriyama:
Foram medidas desesperadas. Era óbvio que eu estava forçando as coisas a se alongarem.

 

Novos personagens também começaram a aparecer. Foi algo que você decidiu sozinho, Toriyama-san, ou foi em consulta com Torishima-san?

Toriyama:
Basicamente, na maioria das vezes eu pedia para Torishima-san avaliar o que eu havia desenhado sozinho.

Torishima:
Quase não houve: “Vá nesta direção” ou “Desenhe algo assim”. Assim sendo, quando ele começou a reclamar que desenhar histórias independentes era difícil, sugeri fazer coisas como uma competição atlética – só isso.

Toriyama:
Dr. Mashirito (imagem 4) também – no início, eu ia fazer apenas um vilão comum, quando você me disse: “Ele não tem características únicas. Deixe-o ainda pior. Então eu disse: “Entendi. Vou pensar sobre isso”, e a essa altura esse personagem já havia surgido na minha cabeça. (risos)

Torishima:
Quando vi o manuscrito finalizado, pensei: “Fui enganado!”. Mas não havia mais tempo para revisões. Como estava em cima do prazo, não tive escolha a não ser dar o OK.

Toriyama:
Bem, eu também havia finalizado bem perto do prazo de propósito. (risos)

Torishima:
Mas naquela época era popular, então eu não poderia dizer pra você parar com isso na próxima vez, certo?

Imagem 4: Sua primeira aparição, no capítulo 67 de Dr. Slump: “A ambição de Dr. Mashirito!! (Parte 1)”

“Eu entregaria meu manuscrito de carro no aeroporto de Nagoya depois de trabalhar a noite toda”

Como você mantinha contato e entregava os manuscritos?

Toriyama:
Geralmente, uma vez por semana, eu recebia um telefonema de Torishima-san, já que eu mesmo nunca ligava pra ele. (risos)

Torishima:
Acho que as nossas ligações duravam 10 ou 15 minutos. Era raro se chegasse a meia hora.

Toriyama:
Isso mesmo. Era cerca de 10 minutos no máximo. Apenas negócios.

Torishima:
Ele não tinha aparelho de fax na época. Então, coisas como manuscritos e storyboards eram enviados pelo correio – algo como um serviço de entrega expressa.

Toriyama:
Acho que mudei para o correio aéreo assim que a série começou. Eu ia entregar de carro no aeroporto de Nagoya, depois de ficar acordado a noite toda trabalhando… (imagem 5) Era um voo de manhã cedo, então o sol da manhã batia nos meus olhos, e eu não sabia dizer qual era a cor dos semáforos; foi muito perigoso. Eu fazia isso toda semana.

Torishima:
Duas vezes por semana. Storyboard e manuscrito concluído, então eram duas vezes.

Toriyama:
E então, se o storyboard fosse rejeitado, eu teria que fazer outra rodada de fotocópias na empresa de materiais de construção ao lado e depois voltar para o aeroporto. Isso foi difícil. Eu devia ter comprado um aparelho de fax antes.

Imagem 5: No capítulo 71 de Dr. Slump: “Todos Querem Parar o Tempo”, o próprio Akira Toriyama aparece a caminho de entregar seu manuscrito completo no aeroporto.

Depois disso, você encerrou Dr. Slump e passou para Dragon Ball.

Torishima:
Isso aconteceu porque o vice-editor-chefe estava conversando com Toriyama-kun, e eu cheguei 30 minutos atrasado porque precisava atender um telefonema ou algo assim. Então ele disse algo como: “Você pode parar se conseguir desenhar algo ainda mais divertido do que o Dr. Slump”, e Toriyama-kun apenas disse: “Entendido”. (risos)

Toriyama:
É porque ele disse que, nas condições dele, eu faria uma história em quadrinhos com um protagonista masculino. (risos)

Torishima:
Então, como escrevi neste livro, Toriyama-kun pegou dicas dos vídeos que assistiu enquanto trabalhava. Quando perguntei o que ele assistia, ele me disse que eram filmes de kung-fu.

Toriyama:
Sim. Muitas vezes eu os assistia em segundo plano, em vez de ouvir música.

Torishima:
Então eu disse: “Nesse caso, por que você não desenha um?” e o que saiu disso foi Dragon Boy (imagem 6).

Toriyama:
Porém, eu era contra fazer isso. As coisas que gosto de assistir nos filmes são diferentes daquilo que eu mesmo quero desenhar. Eu não era bom com o gênero de luta. Além disso, eu não conseguia desenhar caras realmente maus.

Imagem 6: Tangtong, que aparece em Dragon Boy e Dragon Boy Parte 2. Ele tem características de Jackie Chan e Sun Wukong. Sua natureza é mais séria que a de Goku.

“Quase nunca recebi elogios, então isso me deixou feliz”

Torishima:
Já que mencionou isso, não conseguia até o Piccolo Daimaoh em Dragon Ball, não é? No início, você ainda carregava a atmosfera de Dr. Slump, então não era possível desenhar um vilão verdadeiramente malvado.

Toriyama:
Sim, isso mesmo – eu simplesmente não conseguia desenhar alguém que fosse ruim até os ossos. Até então, eu nunca tinha feito Goku matar completamente um oponente com quem ele ficou cara a cara. Achei que deveria experimentar pela primeira vez.

Torishima:
E é por isso que, quando o Grande Rei Demônio está diante de Goku e o manda para longe com uma rajada de vento apenas com um aceno de mão (imagem 7), eu sabia que Toriyama-kun havia dominado a criação de um personagem maligno.

Imagem 7: Tendo restaurado sua juventude usando as Esferas do Dragão, Piccolo Daimaoh domina Goku.

Toriyama:
Ainda me lembro quando me disse isso. Você se preocupa com as coisas mais estranhas, não é? (risos) “A maneira como ele faz isso apenas acenando com a mão – é muito bom”, você disse. Você quase nunca me elogiou, então isso me deixou feliz.

Torishima:
“Quase nunca”? Acho que me lembro de ter-lhe feito alguns elogios.

Toriyama:
Naaaaah, acho que não. (risos) Mas sabe, com um vilão verdadeiramente malvado, ainda haveria esse sentimento de incerteza se eu simplesmente deixasse eles serem derrotados, então eu fiz com que as pessoas fossem ressuscitadas com as Esferas do Dragão.

Torishima:
Você realmente penou até desenhar Dragon Boy, mas assim que encontrou um conceito vencedor, conseguiu montar um storyboard relativamente rápido para o que se tornou Dragon Ball. Você trouxe Sun Wukong como personagem principal e também usou seus Nyoi-bō e Kinto’un.

Nota: Ambos os itens pertenciam ao personagem Sun Wukong, do romance chinês Jornada ao Oeste. Diz-se que o Nyoi-bō (Bastão Mágico) foi feito pelo deus taoísta Laojun, o deificado Lao-tzu, e é capaz de alterar seu tamanho, peso e comprimento sob comando. A Kinto’un (Nuvem Voadora) é uma nuvem controlada através da magia taoísta.

Toriyama:
Até o design do Goku era um macaco no começo, não era? Gostei de Jornada ao Oeste, então pensei em fazer um arranjo dessa história.

Torishima:
Ter um dragão que aparece quando sete esferas são coletadas foi ideia sua, não é, Toriyama-kun? Uma vez firmada a história, a reunião de serialização foi praticamente uma formalidade. Você fez o storyboard do primeiro capítulo, e a série já havia sido iniciada com o segundo capítulo praticamente sem revisão.

Toriyama:
Mas no início ainda era muito cômico. A história era meio complicada e Goku parecia que iria lutar, mas na verdade não lutava tanto.

Torishima:
Embora você tenha tratado isso como um filme de estrada, seu lugar no ranking de popularidade continuou caindo, então pensando que não seria bom se isso continuasse, você iniciou um “arco de treinamento” e trouxe o Kuririn. E quando isso o ajudou a chegar ao topo do ranking e se manter estável, sabe o que você disse? “Sabe, um mangá de história ainda é legal e fácil. Afinal, você pode parar sempre que ficar sem páginas.”

Toriyama:
Sim, porque eu sempre poderia terminar um capítulo com “Continua”. (risos)

Torishima:
Mais tarde, você disse que não poderia continuar com o tamanho do Goku sendo tão pequeno. “Não consigo desenhar ação assim, então quero torná-lo maior”, você disse. Eu fui contra.

Toriyama:
Você se opôs veementemente.

Torishima:
Digo, nós trabalhamos tanto para construir uma audiência para o Goku, e você iria mudá-lo. Não há nada mais assustador do que isso. Mas então você disse: “Não posso continuar a série se não fizer isso”. Então conversei com o editor-chefe e ele respondeu: “Bem, se é isso que ele quer fazer, então por que não?”

Toriyama:
Ele não se importava.

Torishima:
Acho que não. (risos) Eu estava fora de mim de preocupação, então, na tarde do dia em que saiu a primeira edição com o Goku adulto (imagem 8), esperei no departamento editorial, temendo que houvesse gente ligando para reclamar. Mas houve apenas uma ligação, de um adulto. E seu ranking de popularidade permaneceu em primeiro lugar de qualquer maneira, sem mudar nada.

Imagem 8: Goku aparece no 23º Torneio de Artes Marciais já adulto. Mestre Kame e Bulma ficam surpresos ao ver que ele passou de uma criança a um jovem no espaço de apenas três anos.

“Dei cabelo branco ao Super Saiyajin pra não ter que escurecê-lo”

Você disse que não planejou com antecedência a história de Dragon Ball, colocando-a em suspense, correto?

Toriyama:
Sim, certo. Tentei parecer bem dizendo que fiz isso de propósito, mas simplesmente não fiz porque era chato. (risos) Afinal de contas, se um personagem começasse a se mover por vontade própria enquanto eu trabalhava, melhor ainda; Eu pensaria: “Esse personagem realmente funciona inesperadamente bem”. Mas nas pesquisas de popularidade dos personagens, me perguntei por que os vilões ficaram em primeiro lugar em vez do herói. Com Vegeta, eu até me esforcei para não deixá-lo com uma aparência legal, dando-lhe umas entradas extremamente chamativas (imagem 9). (risos)

Imagem 9: Vegeta, aparecendo pela primeira vez após Goku e Piccolo derrotarem Raditz. Dali um ano, ele atacaria a Terra.

Torishima:
Vegeta é popular. Aparentemente, ele é sempre o número 1 na França.

Toriyama:
Sério? Mas por quê?

Torishima:
Além disso, relendo Dragon Ball, as lutas nas partes quando eu era editor tinham muitos socos e combates físicos. Mas à medida que chega às partes posteriores, há mais disputas de energia. É porque eram mais fáceis de desenhar?

Toriyama:
O quê? Nunca! É porque o nível das lutas aumentou, mas ainda pode ter sido um alívio para o meu único assistente. Eu também destruí a arena do Torneio de Artes Marciais rapidamente porque parecia difícil desenhá-la.

Torishima:
Foi também por isso que o cabelo do Super Saiyajin não precisava ser pintado, certo?

Toriyama:
Isso porque a primeira pessoa a terminar a parte da tinta teria que apagar todas as marcas de lápis. (risos)

Torishima:
Quando o vi pela primeira vez, pensei: “Ah, é um atalho, mas acho que os leitores não vão notar”. (imagem 10)

Toriyama:
Ahaha. (risos) Sou um mestre em desculpas plausíveis.

Torishima:
Acho que você é um gênio em fazer as coisas funcionarem, Toriyama-kun.

Imagem 10: Goku, após despertar o Super Saiyajin durante seu confronto com Freeza

“As cenas de ação dentro da minha cabeça vêm de filmes de kung-fu!”

Toriyama:
No que diz respeito à arte de Dragon Ball, acho que pode-se dizer que há a influência do animador Toyo’o Ashida-san. Ele já faleceu, mas ao conhecê-lo e conversar com ele, concordamos em muitas coisas, e a arte de Ashida-san, que era cuidadosa, mas tinha uma tensão nela, era muito boa. E enquanto trabalhávamos nisso e naquilo, parece que ambos influenciamos um ao outro.

Torishima:
Quando foi decidido que Kosuke-sama Rikimaru-sama: Konpei-tou no Ryuu seria transformado em uma animação original baseada em seu conceito, Toriyama-kun, apresentei o diretor de animação Toyo’o Ashida a você através de um conhecido mútuo. Em vez de começar com uma reunião, pensei que seria mais rápido vocês dois começarem a trabalhar depois de discutirem o assunto juntos.

Toriyama:
E então, quando tentei desenhar com o toque artístico de Ashida-san como referência, minha caneta acelerou com confiança ao longo das páginas, então deu uma sensação de velocidade, e eu pude desenhar num instante, fazendo minha velocidade aumentar exponencialmente também. Depois disso, desenhar ação não parecia tão árduo quanto antes.

Torishima:
Então a maneira como suas linhas se tornaram mais fortes e angulares desde a época da luta com Vegeta veio disso. Não sabia.

Toriyama:
Certo. Essa foi a influência de Ashida-san.

Torishima:
Desenhar ação era realmente complicado antes disso?

Toriyama:
Desenhar lentamente com meu toque anterior e mais arredondado não era muito adequado ao movimento da ação, sabe?

Torishima:
Goku ficou mais alto e as linhas ficaram mais angulares (imagem 11), o que adicionou peso e força às suas representações de ação rápida e acelerada.

Toriyama:
Sim. Isso porque as cenas de ação dentro da minha cabeça vêm de filmes de kung-fu. A característica dos movimentos de Bruce Lee, onde ele fica perfeitamente imóvel antes de se mover de repente – adorava isso.

Torishima:
Certamente a ação deste mangá pode ser um tipo original desenvolvido a partir de Bruce Lee, e não de Jackie Chan.

Toriyama:
É especificamente porque o estilo de coreografia de ação do Jackie é algo especial para o live-action, que é difícil de usar no mangá.

Imagem 11: Na metade final da história, a ação irrompe da página com um toque rígido e angular.

Assim como Goku, os inimigos também ficam cada vez mais fortes, com Freeza, Cell e Majin Boo. Você sentiu algum tipo de pressão para fazer ações ainda mais impressionantes do que antes, a fim de igualá-las, Toriyama-san?

Toriyama:
Essa é a coisa mais difícil num mangá de ação. Se você desenhar no mesmo nível da luta anterior, parecerá aos leitores que o nível realmente caiu. Então gradualmente passei a acreditar que há um limite para tornar os personagens mais fortes. Em termos de ter que elevar ainda mais o nível de representação de ação, ficou bastante difícil desde o final da batalha com Freeza.

Torishima:
Esse também teria sido o melhor lugar para parar. (risos)

Toriyama:
Isso é engraçado, vindo de você. (risos)

Torishima:
Bem, quando se tornou tão popular, não poderíamos fazer isso, né?

 

“Eu não teria me tornado cartunista se não fosse por Torishima-san”

De que outras maneiras seu estilo de desenho mudou entre Dr. Slump e Dragon Ball?

Toriyama:
Com Dr. Slump, eu estava basicamente aprendendo a desenhar quadrinhos à medida que avançava, e com a serialização repentina, as partes difíceis eram realmente complicadas. Mesmo quando eu estava fazendo o meu melhor pra cumprir os prazos, eu pegava um resfriado terrível e tinha febre alta no meio das coisas. Tem uns dois capítulos que nem me lembro de ter pintado. (risos) Mas nas últimas partes de Dragon Ball, assim que cheguei às cenas de luta, houve muitas vezes em que passei do storyboard à conclusão em apenas um dia. Claro, não é como se eu estivesse levando o trabalho levianamente, nem nada do tipo.

Torishima:
Afinal, você não perde tempo pensando na história.

Toriyama:
Mas então, por que eu estava sempre tão ocupado que mal conseguia encontrar tempo para dormir…?

Torishima:
Em outras palavras, trata-se de: até onde você pode levar suas criações na direção daquilo em que você é bom. Caso contrário, desenhar mangá se tornará apenas um trabalho e você ficará cansado disso.

Toriyama:
O fato de eu ter trabalhado em uma empresa antes de me tornar cartunista definitivamente tem muito a ver com isso. Se outras pessoas tiverem problemas no trabalho por causa de algo que você fez, isso ficará claro para todos.

Torishima:
Além de você, só ouvi essa ideia — que muitas pessoas ficarão incomodadas se você se atrasar com seu manuscrito — de outras duas pessoas: Akimoto-san e o falecido Kazuki Takahashi-san. Vocês três tiveram experiência como funcionários, empregados em uma empresa.

Nota: Osamu Akimoto, autor de “KochiKame” e Kazuki Takahashi, autor de Yu-Gi-Oh!.

Toriyama:
Quero dizer, cumprir um prazo é uma regra rígida. Não faz diferença se for apenas fazer panfletos. Mas, pensando bem, Torishima-san, se você não estivesse no departamento editorial quando enviei minha inscrição, talvez eu nunca tivesse me tornado um cartunista.

Torishima:
Isso vale para nós dois. Se eu não tivesse conhecido você e sido responsável por lançar um sucesso em meu terceiro ano na empresa, provavelmente teria sido o membro mais oprimido da equipe editorial. (risos)

Toriyama:
No fim, estou feliz. Sempre quis trabalhar em design ou ilustração, mas em algum momento pensei: “Isso é como poder fazer meus filmes favoritos sozinho”, e depois disso minha atitude mudou.

Torishima:
Exceto que ambos estamos conscientes do fato de que isto é um trabalho e não um hobby. Que deveríamos simplesmente fazer isso. Mesmo assim, quase não há ninguém na Jump que tenha feito sucesso com duas séries consecutivas.

Toriyama:
Talvez eu tenha tido sorte. Além disso, receber conselhos de você, Torishima-san, compartimentalizando-os como: “Bem, é apenas um trabalho”, pode ter sido onde as coisas realmente começaram a funcionar. Afinal, nem Dr. Slump nem Dragon Ball eram nada parecidos com o que eu consideraria minha preferência. (risos)

Torishima:
Se você colocar dessa forma, os fãs podem ficar chocados. (risos)

Toriyama:
Qual é! Estou bem ciente de que se eu realmente desenhasse algo do jeito que queria, não seria popular. (risos)

Em junho de 1995, a longa serialização de uma década de Dragon Ball chegou ao fim. Agora, uma nova série continua a evoluir.

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